Espaço vetorial simplético

Fonte: testwiki
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Um espaço vetorial simplético[1] é um espaço vetorial V sobre um corpo F junto com uma forma simplética, isto é, uma função ω:V×VF com as seguintes propriedades:

i) bilinearidade: ω é linear em cada argumento, isto é, para cada xV, vω(v,x) é uma transformação linear de V em F, e analogamente para o segundo argumento.

ii) alternância: para todo vV, ω(v,v)=0.

iii) não-degenerescência: se vV é tal que ω(v,u)=0 para todo uV, então v=0.

Note que, de ii), obtemos ω(u+v,u+v)=0 quaisquer que sejam uV e vV; usando a bilinearidade, temos que ω(u,v)=ω(v,u), isto é, toda forma alternada é antissimétrica. A recíproca é verdadeira em corpos de característica diferente de 2.

Se V tem dimensão finita, a escolha de uma base ordenada v1,,vn nos dá uma matriz W=(ω(vi,vj))i,jMatn,n(F) que é não-singular (pois ω é não-degenerada), antissimétrica e “oca” (hollow) i.e. todas as entradas da diagonal principal são nulas.

Lema. Seja AMatn,n(R) uma matriz quadrada com entradas num anel R comutativo com identidade. Se n é ímpar e A é antissimétrica e oca, então detA=0.

Prova. Como A é oca, temos detA=σD(sgnσ)a1,σ(1)an,σ(n), onde D é o conjunto de todas as permutações de Sn sem pontos fixos. Como n é ímpar, não há involuções – elementos τ com τ2=1 – em D. Em D, declare τστ=σ±1. Trata-se de uma relação de equivalência. Pela ausência de involuções, cada classe de equivalência tem exatamente dois elementos e é da forma {σ,σ1}. Logo, se D é um conjunto de representantes, então D=D(D)1, reunião disjunta. A antissimetria de A finaliza a prova.

Como corolário, obtemos que todo espaço simplético de dimensão finita possui dimensão par.

Se (V,ω) e (W,η) são espaços simpléticos (sobre o mesmo corpo), uma transformação t:VW será dita simplética (ou um simplectomorfismo) quando for linear e satisfizer η(t(u),t(v))=ω(u,v). É imediato que se t é simplética, então Kert={0}. Um isomorfismo de (V,ω) em (W,η) é uma transformação simplética para a qual existe uma inversa também simplética. Não surpreendentemente, no caso dos espaços simpléticos, se uma transformação simplética é invertível, então é um isomorfismo.

Bases simpléticas

Seja (V,ω) um espaço simplético de dimensão finita 2n. Uma base ordenada x1,,xn,y1,,yn é dita simplética quando ω(xi,xj)=ω(yi,yj)=0, ω(xi,yj)=δi,j. Sem supor que um espaço simplético finitamente gerado possui dimensão par, é possível mostrar que há uma base com essas propriedades, provando em particular que a dimensão tem de ser par. Trata-se de um processo análogo ao de Gram-Schmidt.

Considere agora um espaço vetorial U. Considerando espaço vetorial UU, construído a partir dos pares (u,t) com uU,tU, podemos definir uma forma bilinear alternada ωU por ω((u,t),(v,s))=s(u)t(v). Vê-se facilmente que ω é não-degenerada. Num espaço simplético (V,η), um subespaço UV que induz um isomorfismo h:(UU,ωU)(V,η) é chamado de subespaço Lagrangiano. Que um isomorfismo desse tipo existe é consequência imediata da existência de uma base simplética.

Orientação

Uma forma bilinear alternada ω2(V) num espaço vetorial real V de dimensão n é não degenerada se e somente se n é par e ωn/2=ωω é uma forma de volume. Num espaço simplético (V,ω) com base simplética x1,,xn,y1,yn, ω=x1y1+x2y2++xnyn. Então

ωn=(i1,,in)xi1yi1xi2yi2xinyin=σSnxσ(1)yσ(1)xσ(2)yσ(2)xσ(n)yσ(n)=(n!)x1y1x2y2xnyn=(n!)(1)n(n1)/2x1x2xny1y2yn.

Logo ωn orienta V.

Variedades simpléticas

Seja M uma variedade diferenciável. Uma 2-forma ωΩ2(M) será dita não degenerada quando o seguinte se verificar: se X𝔛(M) é um campo de vetores tal que ω(X,Y)=0 para todo campo Y𝔛(M), então X=0. Isso é equivalente a exigir que ωp:TpM×TpM seja não degenerada para todo pM.

Uma variedade simplética é um par (M,ω), com ωΩ2(M) uma 2-forma não-degenerada e fechada: dω=0.

O fibrado cotangente

O fibrado cotangente[2] TM de uma variedade M tem como fibra fixada em pM o espaço dual (TpM). A projeção TMM será denotada por π. Para um sistema local de coordenadas (q1,,qn) em UM, as bases /qi para as fibras do fibrado tangente TM sobre U determinam bases duais para as fibras de TM sobre U, que denotaremos por p1,,pn, de forma que para λπ1(U)TM temos pi(λ)=λ(/qi). Em TM temos então o sistema adaptado de coordenadas (q1π,,qnπ,p1,,pn), que será denotado por (q1,,qn,p1,,pn).

A 1-forma tautológica

Podemos definir a função θ:TMT(TM) por θ(p,λ)(X)=λ(π(X)). Trata-se de uma 1-forma em TM, chamada de forma tautológica. Num sistema adaptado (q1,,qn,p1,,pn), θ se expressa como

θ|π1(U)=i=1npidqi.

A estrutura simplética canônica do fibrado cotangente

Se fizermos ω=dθΩ2(TM), então ω é uma forma simplética em TM. Num sistema adaptado, ω=dpidqi. Disso é consequência que ω é não degenerada. A variedade simplética (TM,ω) é orientada pela forma ωn, como anteriormente.

A estrutura simplética canônica de um fibrado cotangente motiva o seguinte

Teorema (Darboux). Se (M,η) é uma variedade simplética, em torno de cada ponto há um sistema simplético de coordenadas, isto é, uma carta local (q1,,qn,p1,,pn) em que η se expressa como η=dpidqi.

Uma forma simplética dá, portanto, uma orientação.

Mecânica Hamiltoniana

Suponha que um sistema tenha a variedade diferenciável M como espaço de configurações. No fibrado cotangente, com a estrutura simplética canônica, podemos considerar funções hamiltonianas, isto é, funções suaves H:TM. A definição de transformação canônica torna-se mais simples: trata-se de um difeomorfismo Diff(TM) que preserva, via pullback, a forma simplética canônica.

Por não-degenerescência, a uma função hamiltoniana podemos associar um campo de vetores 𝐗H𝔛(TM) da seguinte maneira: i𝐗H(ω)=dH (contração). Isso permite definir colchetes de Poisson: se f,g:TM são hamiltonianas, {f,g}:TM é definida por {f,g}(p)=ωp(𝐗f(p),𝐗g(p)). Em coordenadas simpléticas, recuperamos as fórmulas clássicas. Note-se que a definição de Poisson se generaliza para variedades simpléticas quaisquer. Também se generalizam o Teorema dos Toros Invariantes e a existência de cartas locais (ou semi-locais, em vizinhanças de um toro invariante) do tipo ângulo-ação.[3]

Classificação de p-grupos finitos extraespeciais

Um p-grupo (p primo) finito G é dito extraespecial quando G=Z(G) e |G|=|Z(G)|=p. Exemplos de grupos extraespeciais[4] são o grupo diedral de simetrias do quadrado, D8a,ba4=1,b2=1,ab=a1 e o grupo quaterniônico Q8a,ba4=1,b2=a2,ab=a1, ambos de ordem 8=23. Esses dois grupos não são isomorfos. De fato, podemos definir o homomorfismo β:Q8SL(2,):

a(1001),b(0110).

Temos Kerβ=1. Como SL(2,F) possui uma única involução, a saber I, quando F é um corpo de característica 2, obtemos que Q8 e D8 não são isomorfos, já que D8 possui mais de uma involução.


Seja G um p-grupo finito extraespecial com C=G=Z(G). O subgrupo C é cíclico de ordem p; fixemos um gerador c. Se xG,gG, então [x,gp]=[x,g]p (isso é verdade pois G é central; use as fórmulas [x,yz]= etc). Como |C|=p , [x,gp]=1, donde gpC. Segue que V=G/C é um p-grupo abeliano elementar que pode, portanto, ser visto como um espaço vetorial sobre o corpo GF(p) de p elementos. Se xG,yG o comutador [x,y] depende apenas das classes u=x,v=y em G/C, então faz sentido escrever [x,y]=cf(u,v) para f:V×VGF(p) bem-definida. Notando que [xx1,y]=[x,y][x1,y] e [x,x]=1, temos que f é uma forma bilinear alternada. Se f(u,v)=0 para todo vV, então [x,y]=1 para todo yG; isso significa que u=0, logo (V,f) é um espaço simplético (de dimensão finita, obviamente). Considere agora uma decomposição simplética V=V1Vn, onde Vi é bidimensional com base {ui,vi} de tal forma que f(ui,vi)=1,f(ui,vj)=0 se ij e f(ui,uj)=f(vi,vj)=0 para quaisquer i,j. Faça ui=xi,vi=yi. Então Gi=xi,yi contém C pois f(ui,vi)=1, e é um grupo não-Abeliano de ordem p3. Temos agora que G=G1G2Gn. Ademais, G/C=(G1/C)××(Gn/C) e [Gi,Gj]=1 se ij. A ordem de G é claramente p2n+1.

Produtos centrais

Um grupo G é dito ser o produto central dos subgrupos normais G1,,Gn quando G=G1Gn, [Gi,Gj]=1 para ij e GijiGj=Z(G) para todo i (já que Z(Gi)Z(G) temos que Z(Gi)=Z(G)). Intuitivamente, os centros estão sendo identificados.

Observação 1. Se G é um produto central dos subgrupos normais G1,,Gn, então K=Gi1Gi2 é um produto central dos subgrupos Gi1,Gi2K. Além disso, se K é um produto central dos subgrupos K1,K2,,KK, então G é um produto central dos Gj (ji1, ji2), K1,,K.

Observação 2. Da mesma forma que um produto semidireto interno dá origem a um produto semidireto externo, é possível construir externamente um produto central de dois grupos G,H com centros isomorfos. Dado um isomorfismo θ:Z(G)Z(H), seja N={(g1,gθ)gZ(G)}G×H. O grupo (G×H)/N é um produto central dos subgrupos (G×1)N/NG e (1×H)N/NH. Reciprocamente, se L é um produto central interno dos subgrupos normais G1,G2, então L é isomorfo ao produto central externo de G1 por G2 segundo o isomorfismo idêntico Id:Z(G1)Z(G2).

Da discussão que precede os três parágrafos anteriores, temos a seguinte

Proposição. Um p-grupo extraespecial é um produto central de n subgrupos não-Abelianos de ordem p3 cada, tendo pois ordem p2n+1. Um produto central de grupos não-Abelianos de ordem p3 é um grupo extraespecial.

Não é difícil classificar grupos não-abelianos de ordem p3, p primo. Se p=2, ocorrem apenas os exemplos do início desta seção, D8 e Q8. Se p é ímpar, as classes de isomorfismo dividem-se em duas, de acordo com a maior ordem possível para um elemento (o expoente do grupo): se o expoente for p, teremos um isomorfismo com x,yxp=1=yp,[x,y]x=[x,y]=[x,y]y; se o expoente for p2 ter-se-á um isomorfismo com x,yxp2=1=yp,xy=x1+p. Todos os grupos não-Abelianos de ordem p3 são extraespeciais.

Proposição. Um grupo não-Abeliano de ordem p3 e expoente p2, para p>2, tem a apresentação mencionada.

Prova. Seja xG de ordem p2 e tome wG tal que x,w=G/Z(G)=GabZp×Zp. Caso w tenha ordem p2, então xw tem ordem p; seja xp=wkp,pk. Temos que 1x1wk tem ordem p (aqui usamos a hipótese de que p é ímpar junto com a fórmula (gh)n=gnhn[h,g]n(n1)/2, que vale pois G é central). Como pk e x1wk tem ordem p, os subgrupos gerados por x,x1wk intersectam-se trivialmente, donde segue que G=x,x1wk por comparação de número de elementos. Como [x,x1wk]1 pois G é não-Abeliano, segue que [x,x1wk]=Z(G)=xp, logo [x,x1wk]=xrp, pr. Então se rr1(modp), xp=[x,x1wk]r=[x,(x1wk)r]. Fazendo y=(x1wk)r, temos finalmente que G=x,y e xp2=1=yp,xy=x1+p, como queríamos. O caso em que w já tem ordem p é análogo.

Concretamente, o primeiro tipo de isomorfismo é representado pelo grupo de matrizes {(1ab01c001)|a,b e c em /p}GL(3,p) (se p=2 esse subgrupo de GL(3,2) é diedral), enquanto o segundo é representado pelo produto semidireto AZp2, com o grupo cíclico Zp2 operado canonicamente, por avaliação, pelo grupo ZpA=ggp+1AutZp2 (note-se que (1+p)p1(modp2) então esse gerador de A tem de fato ordem p).

Agora seja G um grupo extraespecial de ordem p2n+1. Se p=2, afirmo que G é um produto central de n grupos D8 ou um produto central de n1grupos D8 e apenas um Q8. Isso porque o produto central Q8Q8de dois grupos Q8 é isomorfo ao produto central D8D8. Usando as apresentações do início da seção, monte apresentações identificando os centros para D8D8a,b,c,d, Q8Q8x,y,z,w e verifique que θ:ax,byz,cz,dwx é um isomorfismo. (Note que a apresentação é obtida fazendo o quociente (Q8×Q8)/(x2,z2), como na Observação 2)

Se p>2, então ou G tem expoente p ou G é um produto central de grupos não abelianos de ordem p3 e expoente p e apenas um grupo não abeliano de ordem p3 e expoente p2. De fato, se L e H são grupos não-Abelianos de ordem p3 com L de expoente p2 e H de expoente p, temos que os produtos centrais LL e HL são isomorfos. Um isomorfismo HLLL é definido por α:ac1x,by,cck,dyd. É isomorfismo pois é sobrejetivo e ambos os grupos têm ordem p5, ou note que a associação que se estende à inversa é α1:xcka,yb,cck,db1d. Aqui, a,bH, c,dLx,y; em HL, [a,b]=ckp e em LL, cp=xp, 0<k<p, 0<<p, kk1(modp2), 1(modp2), além, claro, das relações de centralização e daquelas que caracterizam H,L como representantes dos tipos de isomorfismo mencionados há pouco. Agora basta notar que todo elemento de um monoide no alfabeto {H,L} em que são impostas apenas as relações HL=LH de comutatividade e LL=HL decorrente do isomorfismo, é da forma HHH ou HHHL (estamos usando implicitamente a Observação 1).

Os argumentos anteriores provam o seguinte

Teorema. Para cada n=1,2,3, e para cada p primo ímpar, existem duas classes de isomorfismo de grupos extraespeciais de ordem p2n+1, de acordo com o expoente, p ou p2. A classe de expoente p é representada por um produto central de n grupos isomorfos a H; a outra, pelo produto central de um grupo isomorfo a L e n1 grupos isomorfos a H. É possível exibir apresentações para representantes de cada uma das duas classes.

Um resultado similar, como já vimos, vale para p=2.

Raciocínio inteiramente análogo mostra que um p-grupo finito em que o centro é cíclico e o subgrupo derivado tem ordem p (grupos chamados de extraespeciais generalizados) possui a seguinte propriedade: GZ(G) e G/Z(G) é um p-grupo abeliano elementar de posto par. Esses grupos podem ser expressados como produto central de grupos de dois tipos. Há duas classes de isomorfismo quando fixados |G| e o índice [G:Z] do centro. Isso permite exibir apresentações como anteriormente.

Referências