Álgebra multilinear

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Em matemática, álgebra multilinear amplia os métodos da álgebra linear. Assim como a álgebra linear é construída sob o conceito de um vetor e desenvolve a teoria de espaços vetoriais, a álgebra multilinear baseia-se no conceito de um tensor e desenvolve a teoria de espaços tensoriais.

Aplicações Multilineares

Definição

Sejam V1,,Vk,W espaços vetoriais sobre um corpo 𝕂. Uma aplicação f:V1××VkW é dita multilinear (ou k-linear) se ela é linear em cada uma de suas componentes, isto é, se para todos v1V1,,vi,viVi,,vkVk e α𝕂, valem

f(v1,,vi+vi,,vk)=f(v1,,vi,,vk)+f(v1,,vi,,vk)
f(v1,,αvi,,vk)=αf(v1,,vi,,vk)

É comum encontrar a definição trabalhando sobre R-módulos, em que R é um anel comutativo com unidade, ao invés de sobre um corpo 𝕂. Neste caso a definição é exatamente a mesma.

Exemplos

  1. Toda transformação linear é um caso particular de uma aplicação 1-linear. Qualquer aplicação f:V1××VkW nula, para quaisquer espaços V1,,Vk,W (sobre um mesmo corpo) é k-linear.
  2. Seja 𝕂 um corpo qualquer e m um inteiro positivo qualquer. 𝕂 admite uma estrutura de espaço vetorial sobre ele mesmo. Defina f:𝕂××𝕂𝕂 por f(x1,,xm)=x1xm o produto dos elementos x1,,xm. É fácil verificar que esta aplicação é m-linear.
  3. Mais geralmente, seja V um espaço vetorial sobre 𝕂 (não necessariamente de dimensão finita) e fixe f1,,fmV funcionais lineares quaisquer. Então a aplicação F:V××V𝕂, definida por F(v1,,vn)=f1(v1)fn(vn) é n-linear, como pode ser verificado facilmente.
  4. Sejam n,m inteiros positivos. Os conjuntos 𝕄n(𝕂) e 𝕄m(𝕂), de todas as matrizes n×n e m×m, respectivamente, sobre o corpo 𝕂, formam um 𝕂-espaço vetorial. Fixe uma matriz A, n×m com coeficientes em 𝕂, e defina a aplicação f:𝕄n(𝕂)×𝕄m(𝕂)𝕄nm(𝕂) por
    f(X,Y)=XAY
    das propriedades de produto (usual) de matrizes (herdadas da estrutura de 𝕂), segue que f é uma aplicação 2-linear (ou bilinear).
  5. Considere o espaço 𝕂n. Se α1=(a11,,a1n),,αn=(an1,,ann)𝕂n são vetores (representados na base canônica), então a aplicação f:𝕂n××𝕂n𝕂, definida por
    f(α1,,αn)=det(a11annan1ann)
    é n-linear, como pode ser verificado das propriedades clássicas de determinante. Este exemplo é importante porque é, em certo sentido, a única aplicação multilinear alternada.
  6. Este é um importante exemplo. Sejam V1,,Vk,W 𝕂-espaços vetoriais, f,g:V1××VkW k-lineares e α𝕂. É fácil verificar que as aplicações f+g e αf, definidas por
    (f+g)(v1,,vk)=f(v1,,vk)+g(v1,,vk)
    (αf)(v1,,vk)=αf(v1,,vk)
    são k-lineares. Este exemplo mostra que o espaço de todas as aplicações k-lineares de V1××Vk para W é um subespaço vetorial, do espaço de todas as aplicações nestes domínio e contradomínio. Costuma-se denotar este espaço por (V1,,Vk;W); quando temos um mesmo espaço V repetido k vezes, denota-se simplesmente por k(V;W); e quando o contradomínio é o corpo de escalares, denota-se simplesmente por (V1,,Vk) ou k(V).

Obs.: Todos os exemplos acima ainda valem, trocando "𝕂-espaço vetorial" por "R-módulo" e "corpo 𝕂" por "anel comutativo com unidade R", e a verificação da multilinearidade é exatamente a mesma em ambos os casos.

Construção Universal

Obs.: Tudo o que será feito adiante ainda valerá trocando os nomes "𝕂-espaço vetorial" por "R-módulo" e "corpo 𝕂" por "anel comutativo com unidade R". Isto se deve ao fato de todas as propriedades utilizadas dos espaços vetoriais serem exigidos nos R-módulos (os espaços vetoriais são um caso particular de módulo - módulos sobre corpos). Uma propriedade que um espaço vetorial carrega e um R-módulo geral não é a divisão por escalar não nulo, isto é, num corpo qualquer sempre podemos dividir por qualquer elemento não nulo, mas num anel comutativo com unidade geral não. Por exemplo em , nem sempre podemos dividir por 2.

Considere o seguinte enunciado universal: "dados V1,,Vk espaços vetoriais sobre 𝕂, existe um par (ϕ,M), em que M é um 𝕂-espaço vetorial e ϕ:V1××VkM é k-linear, tal que, dada qualquer f:V1××VkN k-linear, existe única h:MN linear satisfazendo f=hϕ."
O par (ϕ,M) "transforma" qualquer aplicação k-linear em uma aplicação linear. A construção do par (ϕ,M) pode ser feita da seguinte maneira:

Chame de V ao espaço vetorial formal gerado pelos elementos V1××Vk sobre o corpo 𝕂, isto é, os elementos de V são somas finitas de elementos da forma α(v1,,vk), em que α𝕂 e (v1,,vk)V1××Vk, ou seja, o produto de um elemento do corpo com um elemento de V1××Vk. Por exemplo, em V, 1(v1,0,,0)+1(v1,0,,0),1(v1+v1,0,,0) e 1(2v1,0,,0),2(v1,0,,0) são elementos distintos em V. No primeiro par, o primeiro elemento é a soma formal de dois elementos do produto V1××Vk e o segundo elemento é um único elemento em V1××Vk, e são totalmente diferentes. No segundo par, o primeiro elemento é 1 multiplicado por um elemento, e o segundo, é 2 multiplicado por um outro elemento, e são totalmente diferentes.
Considere o subespaço W<V gerado pelos seguintes elementos:

(v1,,vi,,vk)+(v1,,vi,,vk)(v1,,vi+vi,,vk)
(v1,,αvi,,vk)α(v1,,vi,,vk)

em que variam α𝕂 e v1V1,,vi,viVi,,vkVk. Defina o espaço quociente M=V/W e a aplicação ϕ:V1××VkM de forma canônica. Por construção teremos ϕ k-linear, e afirmamos que o par (ϕ,M) é o par que resolve o enunciado universal.

De fato, seja f:V1××VkN k-linear qualquer. Defina a aplicação h:MN, em que se (v1,,vk)V1××Vk, então h(v1,,vk)=f(v1,,vk). Assim sendo, h pode ser estendida por linearidade sobre U, e então, definida unicamente em M. Note que por f ser k-linear, h está bem definida. Por construção temos f=hϕ. Além disso, suponha h também satisfazendo f=hϕ. Então, em particular, h,h coincidem em todos os elementos (v1,,vk)M, e então, h=h. Isso conclui a construção.

Desta construção, temos que o par (ϕ,M) é único. De fato, se (ϕ,M) é outro par que satisfaz o enunciado universal, então, por ϕ:V1××VkM ser k-linear, existe h:MM linear tal que ϕ=hϕ. Do mesmo modo, existe h:MM linear tal que ϕ=hϕ. Destas relações, segue que hhϕ=ϕ=1Mϕ, em que 1M é a identidade em M. Pela unicidade de 1M (pois deve existir uma única aplicação linear 1M:MM tal que ϕ=1Mϕ), teremos necessariamente 1M=hh. Da mesma forma teremos 1M=hh, de onde se conclui que h é um isomorfimos com inversa h. Daí M e M são isomorfos, e tem-se a unicidade.

Produto tensorial

Existem muitas maneiras (equivalentes) de definir "produto tensorial". Apresentaremos alguns. Como de costume, tudo o que for feito poderá ser repetido trocando os termos "𝕂-espaço vetorial" por "R-módulo" e "corpo 𝕂" por "anel comutativo com unidade R". A única exceção é quando fizermos referência à base de espaço vetorial, pois devemos exigir "anel comutativo com unidade livre".

Construção universal

Sejam V1,,Vk espaços vetoriais sobre um corpo 𝕂. Considere o (único) par (ϕ,M) que resolve o enunciado universal acima. O produto tensorial de V1,,Vk é definido como o espaço vetorial M, e é denotado por V1Vk. Se v1V1,,vkVk, então denota-se ϕ(v1,,vk) por v1vk

Proposição: Seguindo a notação acima, os elementos ϕ(v1,,vk)=v1vk geram o espaço M=V1Vk, variando os elementos v1V1,,vkVk
Demonstração: Chame de N o subespaço de M gerado pelos elementos v1vk, como no enunciado, e considere o espaço quociente W=M/N. Isto induz uma aplicação multilinear π:V1VkW (a projeção natural), e considere a aplicação nula g:V1VkW. Note que πϕ=gϕ, e por construção de M, necessariamente π=g, donde se conclui a afirmação.

Corolário: Se u1i,,umii formam uma base para Vi, i=1,,k, então os elementos ui11uikk geram V1Vk, para i1=1,,mk,,ik=1,,mk.

Construção Concreta

Sejam V1,,Vk 𝕂-espaços vetoriais e considere V1,,Vk os seus duais algébricos. O produto tensorial de V1,,Vk, denotado por V1Vk, é o 𝕂-espaço vetorial gerado pelos elementos f1fk (produto de funções), em que se variam f1V1,,fkVk.

Ver também


Predefinição:Áreas da matemática Predefinição:Esboço-matemática